rushhour

Antal Heitalger é um homem de gosto refinado e gosta de compartilhar seus prazeres com gente que possui vícios e hábitos parecidos com o dele. Foi isto que o levou a criar a loja e selo Rush Hour, um bastião de qualidade musical e cultura do vinil em Amsterdam e selo que ajudou a reerguer e redescobrir muitos dos pioneiros que originaram esse troço todo que amamos tanto chamado House Music.

Ele sempre vem ao Brasil buscar raridades fonográficas, já que sua paixão por ritmos da diáspora africana não se esgota apenas na sua encarnação mais jovem e eletrônica, ela transborda por todas as formas que ela adquiriu. Tanto que, se arriscar um pulo por qualquer loja de boa reputação do Centro de São Paulo durante uma de suas visitas ao país, é bem provável que você encontre ele com as mãos enterradas nos casulos, prestigiando seus pares empresariais e se refestelando no farto material de seus ídolos musicais.

antal-650Então, comecemos do início, como é prudente. Fale-nos um pouco sobre como a Rush Hour começou. Qual o ímpeto que impulsionou sua criação e como ela se tornou o que é hoje?

A Rush Hour era uma loja, eu e o Cristiaan (McDonald, co-fundador do selo) a criamos para ter mais acesso a discos. Todos nós éramos colecionadores, ávidos exploradores de lojas e caçadores de música, fosse ela rara ou não e a loja era nosso repositório. Começamos a garimpar discos que nos interessavam e importá-los, daí surgiu a necessidade de nós mesmos reeditarmos alguns títulos que, de outra maneira, estariam fora de nosso alcance. Prensamos 500 cópias de um e acabou dando certo desde o início. Engrenamos nesse projeto, até mesmo com amigos locais que tentavam lançar suas músicas no mercado, como a Delsin Records, utilizando nossos serviços, e aí já estava tudo consolidado.

Ela já começou no mesmo local histórico em que se encontra hoje em dia e que atrai compradores de todo o mundo?

Não. Ela teve sua primeira encarnação no subsolo de um cabeleireiro, em outra região da cidade. Quando a demanda começou a ficar maior e nos encontramos com uma operação mais volumosa do que aquilo que o espaço podia comportar, além de algumas rusgas com nosso vizinho comercial de cima, decidimos nos mudar para o local em que a Rush Hour se encontra hoje em dia e as pessoas pelo mundo afora conhecem.

E quanto ao apoio à cena local que sempre rolou com artistas como M>O>S, Awanto3, Z62YU51345689771Aardvark e tantos outros?

Este sempre foi um de nossos pontos de honra, mesmo  que tenhamos nos tornado renomados por nossos relançamentos de clássicos e raridades obscuras sempre houve muita música para ser lançada da Holanda e, especialmente de Amsterdam. Esses artistas que você citou são excelentes exemplos, pois são alguns dos mais brilhantes que tivemos o privilégio de lançar e isso foi feito desde suas primeiras investidas na arte, desde a década passada até hoje.

Isso é algo que se mantém até hoje com firmeza no propósito do selo, não? Se notarmos como a Rush Hour se manteve como um escoadouro de talento inovador, não holandês como de toda a Europa, gente como Xosar, Moiré, Young Marco…

Certamente. Esse propósito foi bem delineado desde o início, como acabei de dizer, e se estendeu até hoje simplesmente porque ainda há muita música que acreditamos ser boa o suficiente para ser lançada. E, não só isso, que mereça ser lançada em vinil, o que exige uma dedicação e empenho distintos do que no modo estritamente digital. Ou seja, valorizamos de outra forma tudo que não só lançamos por todos as nossas subsidiárias, mas também tudo que pomos no mercado como distribuidora.

E também há outros sustentáculos na operação, como o Kindred Spirits, a Disco3000, as subsidiárias da Rush Hour, além das festas homônimas. Como isso surgiu a partir dos esforços iniciais?

Todos eles são frutos da necessidade de criar vias para a vazão de música que, no final das contas, era colossal em termos de volume e variedade. Cada uma dessas frentes corresponde à vontade de divulgar os trabalhos que imaginávamos que deveriam se tornar essenciais para todos, assim como eram para nós. A Kindred Spirits, por exemplo, é uma iniciativa germinada por Kees Funkaholic, o DJ que me inspirou a começar a tocar, uma fonte inesgotável de conhecimento e devoção musicais e que, na verdade, foi quem impeliu a cena de Amsterdam desde muito cedo como um exemplo a ser seguido. A Disco3000 foi algo mais momentâneo que criei para lançar alguns EPs que não tinham tanta compatibilidade com o espectro sonoro recoberto pela Rush Hour, e assim por diante…

de-0622-485514-frontE a relação tão próxima com o Brasil e a música nativa, como foi que isso surgiu?

Olha, pode ate soar como um clichê dos mais batidos, mas além de sempre ter amado a música do seu país, eu sou fanático por futebol. Meu amor pelo esporte era tão sério e profundo que até cogitei uma carreira como jogador profissional na adolescência, mas a vocação musical falou mais alto no final. A minha primeira viagem ao Brasil foi com uma namorada, já a algum tempo, eu passei a amor parte do nosso tempo aqui caçando discos e conhecendo lojas, além de assistindo a uma ou outra partida. Foi maravilhoso! Só não posso garantir que tenha sido para ela também.

Ao menos o relacionamento com o Brasil parece ter sido mais duradouro…

É algo muito valioso para mim, de verdade. E independentemente de épocas ou sonoridades específicas, desde Bossa Nova, indo até Marcos Valle, Tim Maia e chegando ao Bixiga 70, tudo me fascina. É a riqueza tão intrínseca aos rirtmos e harmonias que impregna tudo que é feito no Brasil. Por exemplo, o Afrobeat, na sua matriz original nigeriana é algo bem denso e complexo e se torna bem difícil ouvir ou mesmo dançar após longos períodos, é inevitável que ele sature seus sentidos, mas no caso do Bixiga 70 e algo muito distinto, mesmo que use a base musical original. Há uma abordagem diferente, mais arejada e refrescante, imaginativa a ponto de neutralizar ou diluir os rígidos preceitos harmônicos e rítmicos fundamentais.

Pra trilhar a leitura: selectah de música brasileira de Antal Heitlager.

+info:
http://soundcloud.com/antalrushhour
http://rushhourmusic.com