Como adiantamos recentemente, o BROKZILL! é um novo projeto musical que une Brasil e Estados Unidos em um super grupo formado por lendas como o produtor Prince Paul (produtor dos primeiros discos do De La Soul), Ladybug Mecca (do Digable Planets), Don Newkirk e o brasileiro Rodrigo Brandão (que integrou Mamelo Sound System, Zulumbi, entre outros projetos bacanas).
Eles acabaram de lançar o álbum de estreia “Throwback To The Future” que já figura entre um dos destaques do ano por aqui. O disco saiu pela Tommy Boy Records e contém doze faixas moldadas em cima da música afro-brasileira sob produção de Prince Paul, misturando rimas em inglês e português e com um timaço de convidados contando com nomes como Del The Funky Homosapien, Count Bass D, Brian Jackson, Elo da Corrente, Fafá de Belém, Juçara Marçal, Kiko Dinucci, Thiago França, Thaíde, Xis, Espião e Rodrigo Ogi.
Trocamos uma idéia com o Rodrigo Brandão, elo principal da união desse supergrupo, pra saber como toda essa história aconteceu. Se liga nas idéias e ouça o álbum na íntegra em seguida. Vale muito o confere!
SPM: Primeiramente, conte pra gente como começou o seu contato com o Prince Paul e a Ladybug Mecca?
Brandão: ‘Quando o Prince Paul veio pra SP pela 1a vez, em 2006, a gente se conheceu, por intermédio do Scotty Hard, lendário produtor e engenheiro de som que, não por acaso, assina a mixagem do Throwback To The Future.
Paul curtiu minha performance no palco com o Mamelo Sound System, e depois de um almoço que fluiu ideia até tarde da noite, ele disse que sempre quis fazer um disco de hip hop com influência brasileira. Eu achei muito style, mas só entendi que aquilo era um convite quando o Prince me perguntou se eu toparia ser parceiro dele nesse projeto.
Demorei pra acreditar que aquele totem da cultura de rua tava pedindo para eu fazer música com ele!
Quando enfim começou a alquimia, em 2010, durante um intervalo das sessões que fizemos no estúdio do Paul, em Long Island, ele comentou que tinha uma amiga que era MC, filha de brasileiros, e ela tava afim de participar.
Quando perguntei o nome da mina, descobri que se trata da minha rapper favorita!
E desde o instante em que a gente se encontrou, já viramos irmãos instantaneamente: rolou um abraço apertado, saímos falando num misto de português com inglês, no mesmo dia já escolhemos um beat, definimos o tema, escrevemos os versos, o refrão e gravamos. Fluiu muito forte, e daí pra ela se tornar integrante do grupo, foi um passo natural.’
SPM: A partir desse contato já surgiu a idéia de um projeto juntos? Como o BROOKZILL! foi se criando?
Brandão: ‘Pra mim, é surreal o quanto tudo foi simplesmente acontecendo… Claro que teve muito sangue, suor e lágrimas no processo, mas até hoje essa benção se mantém intacta: mesmo o nome surgiu numa conversa informal. Tem algo de muito natural na catiça que esse encontro conjurou. Só posso agradecer!’
SPM: O álbum tem uma sonoridade afro-brasileira, desde os samples, até os beats cheios de batuques. Acredito que essa sonoridade tenha sido introduzida por você, certo? Eles já tinham conhecimento sobre a música brasileira?
Brandão: ‘Sim, eu fui contemplado com a oportunidade de trazer os Orixás pra linha de frente do disco.
A música desse país é muito vasta, são milhares de estilos, então quando se fala em “sample brasileiro”, pode ser bossa nova, como o J. Dilla fez em Runnin’, do Pharcyde; pode ser funk, que nem aquela do Marcos Valle que o Maroons (Chief XL, do Blackalicious + Lateef The Truth Speaker) usou, ou samba, vide Rappin’ Hood, Xis, De Leve e outros. Quanto a mim, faz tempo que percebi a relação entre os cantos de terreiro e a essência do rap… O ‘meu’ Brasil é macumbeiro, marginal e maravilhoso.
Todos do grupo se conectaram de imediato com o AXÉ. Cada um a seu modo, se identificaram, absorveram, e incorporaram isso. Assim como já tinham suas respectivas sementes de som daqui plantados na alma, liga? Don saca e sente a bossa nova desde que a gente se conheceu; Paul mal sabe nome de artista mas flagra os breakbeats clássicos, e cada vez se empolga mais… Vale dar uma sacada no set que ele fez semana passada pro programa do Quantic na RBMA Radio; e a Ladybug já tinha isso guardado desde a infância. Eu só fiz destravar: na primeira música da Clara Nunes que toquei, ela já saiu cantando a melodia!’
SPM: Como foi pra você ter uma lenda como Prince Paul criando beats em cima da nossa música?
Brandão: ‘Uma vez, muitos anos antes disso tudo se desenhar, eu fazia o programa de webradio Vitrola Invisível, com o Rica Amabis, do Instituto. Cada semana tinha um tema, e certo dia foi dedicado aos beatmakers mais revolucionários da história do hip hop. Durante a gravação, ele me perguntou: “Se você pudesse escolher um desses pra produzir seu som, quem seria?”. Mesmo com nomes como RZA, Pete Rock e Premier na lista, minha resposta foi Prince Paul, na lata. E quando a vida levou a isso, ele surpreendeu muito na abordagem, arranjo, corte de sample… Chapou tanto eu quanto a banca toda de artistas brasileiros envolvidos.’
SPM: O disco tem muitas participações especiais. Tanto brasileiras como gringas. Fale um pouco sobre essas participações e de como elas engrandeceram ainda mais o resultado final do álbum.
Brandão: ‘Desde o começo, alguns parâmetros foram estabelecidos: que a gente deveria sempre estar na mesma sala pra criar, ao invés de trocar arquivos pela net; nada de hierarquia e sim parceiros de igual pra igual; e que a pegada é One Nation Under A Groove, transcende o núcleo central.
Então, incluir vários convidados foi um recurso espontâneo. Mas o que definiu quem entraria onde foram as músicas em si… tudo foi decidido a partir do que os beats falaram pra gente! E também não teve ninguém que caiu de pára-quedas, sempre passou por relação pessoal prévia, com um ou mais integrantes do grupo.
Dito isso, vale ressaltar a alegria que foi gravar a S. Bento MC5 com todos os rimadores juntos no estúdio, sem qualquer sinal de competição; as sessões com Paul e Newkirk aqui, interagindo com meus amigos do Hurtmold, Metá Metá, Nação Zumbi, Elo Da Corrente… Sem falar na gargalhada da Fafá De Belém depois de matar a pau no primeiro take, ou o dia que o Brian Jackson gravou flauta e teclado na sala da casa dele, comigo, e um poster do Miles Davis olhando de canto.’
SPM: Vi que já rolaram algumas apresentações em NYC. Como foi a receptividade do público?
Brandão: ‘Em todas as ocasiões, a reação do público me surpreendeu muito! Foi bem caloroso e sintonizado. Sempre me disseram q a platéia de NY é a mais casca grossa do mundo, mas o que vivenciei contradiz isso totalmente. Nem a barreira de idioma pareceu se manifestar, mano.
Sem falar que o High Priest do Anti Pop Consortium viajou quase 3 horas só por causa do show, que o DJ J. Period foi ver nosso set na festa da Natasha Diggs mesmo com viagem marcada pra L.A. na sequência, que o Ilham do Wax Poetics deu um jeito de chegar, mesmo com a esposa no hospital. E o Brian Jackson fez questão de tocar com a gente independente de cachê. Tudo isso, pra mim, tem um valor gigante.
Foram todas contribuições orgânicas, e sinto que isso tudo passa no som. Detesto quando ouço certas tracks e percebo que aquilo é só uma soma de partes individuais, que não gerou liga real. Música é energia, e a maquiagem só engana quem tá distraído ou nunca ouviu o Flavor Flav cantar Don’t Believe The Hype!’
SPM: E como está a programação de shows? Vai rolar uma tour por aqui?
Brandão: ‘A gente quer cair na estrada, sem dúvida. Creio que entre as agendas individuais e o inverno deles, deve rolar no começo do ano que vem a turnê norte-americana. Por aqui, no momento o que tem é vontade de monte, da nossa parte, e da galera que tá atenta ao que a gente vem construindo. Mas na hora certa vai rolar sim.’
E que role rápido!
Agora aproveite e ouça o petardo abaixo na íntegra em alto e bom som!
BROOKZILL! – Throwback To The Future (Tommy Boy, 2016)
Bônus:
Assista a participação do BROKZILL! no programa ‘Sway In The Morning’
Comentários